Emanuela Firmino tinha 15 anos quando o pai, Agilson Santos Firmino, e o irmão Uilder foram assassinados a mando do ex-deputado e ex-coronel da PM do Acre Hildebrando Pascoal, no que ficou conhecido como o crime da motosserra.
O crime ocorreu após a morte de Itamar Pascoal, irmão de Hildebrando. O pai dela estava com o assassino de Itamar na hora do crime. Hildebrando foi condenado a 18 anos pela morte de Firmino há exatamente um ano.
Leia o depoimento de Emanuela, 29
"Meu pai estava montando um restaurante no interior do Acre para o pessoal que trabalhava com José Hugo na construção. Ele estava no local errado e na hora errada quando Hugo assassinou o irmão de Hildebrando. Depois disso, eu não o vi mais.
Dois homens chegaram em casa falando que ele estava preso, embriagado, e que precisava de um filho para fazer curativos.
Eles estavam sem a farda, mas mostraram a carteira de policial civil. Minha mãe decidiu ir com eles.
Depois de 15 minutos, voltaram sem ela para buscar um dos filhos. Eu queria ir, mas eles não deixaram por eu ser mulher. O Uilder, que tinha 13 anos, disse que iria.
Em seguida, minha mãe voltou, mas sem meu irmão. Isso era domingo à noite. Eu tinha 15 anos e amadureci naquele dia.
O corpo
Dois dias depois, saiu na rádio que tinham encontrado um corpo. Pensamos que era meu irmão, porque achávamos que meu pai tinha assassinado junto com o José Hugo e deixado a gente para pagar por tudo.
No caminho para o IML, ficamos com medo e decidimos ir para a casa de uma amiga. Lá, a televisão mostrou o corpo, e esse corpo era do meu pai.
Ver a pessoa que mais me amava na vida... Ele estava com um furo na cabeça. Mostrou o rosto, e falou que tinham serrado as pernas e os braços dele.
Procuramos a Secretaria de Segurança Pública, mas falaram que era para irmos embora com a roupa do corpo, porque não podiam fazer nada. Nós passamos uma semana escondidos, até que a família pagou para sairmos do Acre.
Na quinta-feira, apareceu o corpo de meu irmão, mas não vimos porque onde estávamos escondidos não tinha TV. Uma vizinha contou e a gente deduziu que era ele pelas roupas.
No julgamento, no ano passado, o juiz me mostrou as fotos. Doeu, sofri, mas foi melhor para ter certeza que meu irmão morreu e que foi para me salvar.
Indenização
Eu e meu irmão menor passamos a adolescência revoltados com meu pai. Se ele sabia que ia assassinar, deveria ter avisado para que a gente fugisse.
Passados 13 anos, no julgamento de Hildebrando descobrimos que ele não matou ninguém.
O Estado tem que dar uma pensão para minha mãe. Ela é extremamente deprimida e trabalha limpando chão e privada com quase 60 anos porque fizeram isso com a nossa família.
Quero que a ajudem e quero enterrar meu pai e meu irmão. Vou me sentir realizada quando acontecer isso.
"Semana no inferno"
Eu dizia que ia escrever um livro e o nome seria "Uma semana no inferno". Mas minha mãe tinha pavor de tudo.
No ano passado, o Ministério Público achou a gente. Antes, tínhamos ido à delegacia reconhecer fotos de policiais, mas eu não queira contato."
Após 14 anos, família enterra pai e filho hoje
Após 14 anos do crime da motosserra, a família de Agilson Santos Firmino e de seu filho Uilder poderá finalmente enterrá-los. A cerimônia deve ocorrer hoje.
O restos mortais das vítimas foram enviados sexta à cidade onde a viúva e os outros dois filhos de Firmino vivem desde que deixaram o Acre. Por segurança, o local não pode ser revelado.
A família recebeu os atestados de óbito dia 15. Para Emanuela Firmino, filha de Agilson, os papéis só foram expedidos após o jornalista Altino Machado [leia neste blog] cobrar as autoridades em seu blog.
"Expressei a vontade de receber as ossadas no julgamento de meu irmão, em novembro passado. Se não fosse o blog, os atestados não teriam saído", diz.
Segundo o secretário de Justiça e Direitos Humanos do Acre, José Henrique Corinto de Moura, a demora se deve à burocracia. "O Estado nunca se negou a enviar as ossadas, mas precisava da certidão de óbito. O processo acabou dia 14", disse.
O procurador-geral do Ministério Público do Acre, Sammy Lopes, estuda a possibilidade de indenização. "Quem cometeu o ato de brutalidade e o assassinato era agente do Estado." No julgamento de Hildebrando, a família teve pedido de indenização negado.
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